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A JUSTIÇA, O PODER DE POLÍCIA E O ALVARÁ DE ESTABELECIMENTO

  De início, é preciso esclarecer que não pertence à alçada municipal fiscalizar a capacidade ou legitimidade do exercício profissional de ninguém, ou examinar se a pessoa está auferindo lucros ou prejuízos. Não cabe ao Município investigar oficialmente se o registro de um Médico é legítimo, ou se aquele Contador entende realmente de Contabilidade. Compete à Administração Municipal, isso sim, fiscalizar os aspectos de segurança, higiene, localização, horário de funcionamento, sossego público e se a atividade autorizada não foi desvirtuada para outras não aprovadas. Não importa qual seja a atividade e sua localização. Parte da Sentença de Juiz sobre a exigência de alvará de funcionamento de um templo religioso: “(...) Outro equívoco da Impetrante, reside no fato de que, não obstante, no âmbito deste Município, tenha a isenção da Taxa de Funcionamento, tal fato não lhe exime de obter a respectiva Licença de Funcionamento, em virtude da existência de norma legal lhe impondo tal obrigação.

ISS NA CONSTRUÇÃO CIVIL: POSSIBILIDADE DE DEDUÇÃO NO VALOR DOS MATERIAIS DA BASE DE CÁLCULO


Recentemente, 1ª e 2ª turmas do STJ reviram seus posicionamentos anteriores e seguiram a orientação do STF para consolidar o entendimento de que os materiais aplicados na obra devem ser excluídos da base de cálculo do ISS.
1.O art. 156, III, da Constituição Federal do Brasil de 1988 (CF/88) dispõe sobre a competência dos Municípios para instituir, dentre outros, o imposto sobre serviços de qualquer natureza (ISS):
“Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:
(...)
III - serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar;”
2.Por sua vez, o art. 146, III, a), da CF/88 estabelece à lei complementar a definiçãodos tributos e suas respectivas bases de cálculo:
“Art. 146. Cabe à lei complementar:
(...)
III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre:
a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes;”
3.O art. 7º, § 2º, I, da Lei Complementar (LC) nº 116/03, excluiu da base de cálculo do ISS o valor dos materiais fornecidos pelo prestador dos serviços previstos nos itens 7.02 e 7.05 da lista de serviços anexa à referida LC:
“Art. 7º A base de cálculo do imposto é o preço do serviço.
(...)
§ 2º Não se incluem na base de cálculo do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza:
I – o valor dos materiais fornecidos pelo prestador dos serviços previstos nos itens 7.02 e 7.05 da lista de serviços anexa a esta Lei Complementar;”
4.E nem poderia ser diferente, porque o objetivo do referido dispositivo legal é tributar apenas o valor do serviço de construção civil prestado, que configura a obrigação de fazer.

5.Com efeito, a jurisprudência do E. Supremo Tribunal Federal (STF), proferida sob a égide do Decreto-Lei (DL) nº 406, de 31.12.1968, cuja repercussão geral já foi, inclusive, reconhecida, é pacífica no sentido de que é constitucional a exclusão da base de cálculo do ISS dos materiais empregados na construção civil.
6.Nesse sentido foi a decisão monocrática proferida pela Ministra ELLEN GRACIE, no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) nº 603.497 que reconheceu a repercussão geral da referida matéria para reafirmar ajurisprudência pacífica do E. STF:
“(...)
A hipótese dos autos versa sobre a constitucionalidade da incidência do ISS sobre materiais empregados na construção civil. O acórdão assim decidiu:
“TRIBUTÁRIO – ISS – CONSTRUÇÃO CIVIL – BASE DE CÁLCULO – MATERIAL EMPREGADO – DEDUÇÃO – IMPOSSIBILIDADE.
A jurisprudência desta Corte pacificou o entendimento de que a base de cálculo do ISS é o preço total do serviço, de maneira que, na hipótese de construção civil, não pode haver a subtração do material empregado para efeito de definição da base de cálculo. Precedentes de Corte.Agravo regimental improvido.”
2. Este Tribunal, no julgamento do RE 603.497, de minha relatoria, reconheceu a existência da repercussão geral da matéria para que os efeitos do art. 543-B do CPC possam ser aplicados.Esta Corte firmou o entendimento no sentido da possibilidade da dedução da base de cálculo do ISS dos materiais empregados na construção civil. Cito os seguintes julgados: RE 262.598, red. para o acórdão Min. Cármen Lúcia, 1ª Turma, DJe 27.09.2007; RE 362.666-AgR, rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª Turma, DJe 27.03.2008; RE 239.360-AgR, rel. Min. Eros Grau, 2ª Turma, DJe 31.07.2008; RE 438.166-AgR, rel. Min. Carlos Britto, 1ª Turma, DJ 28.04.2006; AI 619.095-AgR, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 1ª Turma, DJ 17.08.2007; RE 214.414-AgR, rel. Min. Carlos Velloso, 2ª Turma, DJ 29.11.2002; AI 675.163, rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe 06.09.2007; RE 575.684, rel. Min. Cezar Peluso, DJe 15.09.2009; AI 720.338, rel. Min. Joaquim Barbosa, DJe 25.02.2009; RE 602.618, rel. Min. Celso de Mello, DJe 15.09.2009.
O acórdão recorrido divergiu desse entendimento.
3. Ante o exposto, com fundamento no art. 557, § 1º-A, do CPC, dou provimento ao recurso extraordinário.
(...)”
(DJe de 16.09.2010 )
7.No mesmo sentido foi o acórdão unânime proferido pela 2ª Turma do STF, no julgamento do RE nº 599.582, de que foi relator o Ministro AYRES BRITTO:
“EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ISS. CONSTRUÇÃO CIVIL. BASE DE CÁLCULO. ABATIMENTO DOS MATERIAIS E SUBEMPREITADAS. POSSIBILIDADE. 1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de que o art. 9º do Decreto-Lei 406/1968 foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988. Pelo que é possível a dedução da base de cálculo do ISS dos valores dos materiais utilizados em construção civil e das subempreitadas. 2. Agravo regimental desprovido.”
(DJe de 29.03.2011)
8.A referida jurisprudência tem origem no julgamento do RE nº 236.604, pelo Plenário do E. STF, em 26.05.1999, de que foi relator o Ministro CARLOS VELLOSO, em que se decidiu que o art. 9º, §§ 1º e 3º do DL nº 406/68 foi recepcionado pela CF/88 como lei complementar e, pois, competente para definir a base de cálculo do ISS, conforme se verifica do acórdão proferido no julgamento do Agravo regimental (AgRg) no RE nº 214.414, de que foi também relator o Ministro CARLOS VELLOSO:
“EMENTA: CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. ISS. CONSTRUÇÃO CIVIL. D.L. 406/68, art. 9º, § 2º, a e b. I. - Dedução do valor dos materiais e subempreitadas no cálculo do preço do serviço. D.L. 406/68, art. 9º, § 2º, a e b: dispositivos recebidos pela CF/88. Citados dispositivos do art. 9º, § 2º, cuidam da base de cálculo do ISS e não configuram isenção. Inocorrência de ofensa ao art. 151, III, art. 34, ADCT/88, art. 150, II e 145, § 1º, CF/88. RE 236.604-PR, Velloso, Plenário, 26.5.99, RTJ 170/1001. II. - RE conhecido e provido. Agravo improvido.”
(DJ de 05.11.2002)
9.Além disso, não há que se falar mais no posicionamento divergente do Superior Tribunal de Justiça (STJ) (entre outros: AgRg no RESP nº 1.209472/SC, rel. Min. ARNALDO ESTEVES LIMA, DJe de 23.02.3011, AgRg no Ag nº 1.257.286/RS, rel. Min. BENEDITO GONÇALVES,Primeira Turma, DJede 08.06.2010), porque, recentemente, as 1ª e 2ª Turmas reviram seus posicionamentos anteriores e seguiram a orientação do E. STF referida acima para consolidar o entendimento de que os materiais aplicados na obra devem ser excluídos da base de cálculo do ISS (1ª Turma do STJ– AgRg no AG nº 1.422.997/RJ, rel. Min. ARNALDO ESTEVES LIMA e 2ª Turma do STJ – AgRg no AgRg no RESP nº 1.228.175/MG, rel. Min HUMBERTO MARTINS).
10.Ora, se a intenção do legislador fosse ampliar a base de cálculo do ISS para determinar a inclusão dos valores dos materiais aplicados na obra, assim teria disciplinado, de forma expressa, na LC nº 116/03.
11.Vê-se, pois, que deve ser excluído da base de cálculo do ISS os valores referentes ao material empregado na obra, sob pena de ofensa aosarts. 7º, § 2º, I, da LC nº 116/2003, 156, III, 146, III, a), da CF/88.


Autor: 

Advogado. Sócio de Toscano & Chernicharo Advogados em Vitória (ES). Ex-sócio do escritório Ulhôa Canto, Rezende e Guerra Advogados - Rio de Janeiro. Bacharel em Direito pela Universidade Cândido Mendes (RJ). Pós Graduado em Direito Tributário Lato Sensu pela Fundação Getúlio Vargas (RJ).

Fonte: 

Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2002 ABNT):

SILVEIRA, Daniel Chernicharo da. ISS na construção civil: possibilidade de dedução do valor dos materiais da base de cálculo. Jus Navigandi, Teresina, ano 17n. 324924 maio 2012 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/21849>


Leia mais: http://jus.com.br/revista/texto/21849/iss-na-construcao-civil-possibilidade-de-deducao-do-valor-dos-materiais-da-base-de-calculo#ixzz1wTYIAGik
 

Comentários

  1. Esses novos entendimentos do STJ, seguindo a linha do STF, parece-nos que será, realmente, o novo norte da tributação dos serviços. Entretanto, os Municípios devem intensificar a sua fiscalização por meios mais eficientes, caso contrário a perda na arrecadação será bastante significativa, visto que, pelo menos, no Município no qual sou Auditor Fiscal 65% do ISS efetivamente arrecadado provém dos serviços tributados na construção civil. Uma nova alteração quanto aos limites. máximo e mínimo, das alíquotas da exação deverá ser analisada, pois grande parte, ainda, dos Municípios brasileiros não dispõem de de um setor fiscalizatório eficiente. Allan Maux

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