De início, é preciso esclarecer que não pertence à alçada municipal fiscalizar a capacidade ou legitimidade do exercício profissional de ninguém, ou examinar se a pessoa está auferindo lucros ou prejuízos. Não cabe ao Município investigar oficialmente se o registro de um Médico é legítimo, ou se aquele Contador entende realmente de Contabilidade. Compete à Administração Municipal, isso sim, fiscalizar os aspectos de segurança, higiene, localização, horário de funcionamento, sossego público e se a atividade autorizada não foi desvirtuada para outras não aprovadas. Não importa qual seja a atividade e sua localização. Parte da Sentença de Juiz sobre a exigência de alvará de funcionamento de um templo religioso: “(...) Outro equívoco da Impetrante, reside no fato de que, não obstante, no âmbito deste Município, tenha a isenção da Taxa de Funcionamento, tal fato não lhe exime de obter a respectiva Licença de Funcionamento, em virtude da existência de norma legal lhe impondo tal obriga...
Os serviços de engenharia de detalhamento, que envolvem
cálculos, especificações e desenhos, não são executados no canteiro da obra,
mas no escritório da empresa construtora. Assim, o município que abriga a obra
não pode cobrar Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza pelo trabalho de
engenharia consultiva, conforme prevê o artigo 3º da Lei Complementar 116/2003.
Com este
fundamento, a 22ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul
manteve liminar que vedou a cobrança de ISS, movida pelo município de
Alpestre contra uma empresa de engenharia. A controvérsia envolve a tributação
sobre a construção da usina hidrelétrica Foz do Chapecó, situada parcialmente
em Alpestre, cuja obra foi executada por terceira empresa, e não pela companhia
que atuou apenas como consultora.
Contra o
lançamento do tributo pelo município gaúcho, a construtora ajuizou Ação Anulatória
de Débito Fiscal cumulada com pedido de antecipação de tutela, por vício de
motivação. Alegou que a prestação dos serviços de engenharia consultiva se deu
Florianópolis, onde tem uma unidade, e não em Alpestre. Ou seja, as notas
fiscais foram emitidas a partir do estabelecimento catarinense. Disse, ainda,
haver declaração do contratante de que os serviços não foram prestados no
canteiro de obras. Logo, o ente público não seria parte legítima para cobrar o
tributo.
O juiz Davi
de Sousa Lopes, da 1ª Vara Judicial de Planalto, negou a liminar, por não
enxergar perigo de dano irreparável nem probabilidade do direito
alegado. O julgador citou precedente do Superior Tribunal de Justiça:
‘‘Em se
tratando de construção civil, diferentemente, antes ou depois da lei
complementar, o imposto é devido no local da construção (art. 12, letra b do DL
406/68, e art. 3º, da LC 116/2003). Mesmo estabeleça o contrato diversas etapas
da obra de construção, muitas das quais realizadas fora da obra e em município
diverso, onde esteja a sede da prestadora, considera-se a obra como uma
universalidade, sem divisão das etapas de execução para efeito de recolhimento
do ISS” (REsp 1.117.121-SP).
A empresa
interpôs Agravo de Instrumento no TJ-RS, repetindo os argumentos da
petição inicial. Acrescentou que o caso dos autos é de engenharia consultiva,
enquanto o paradigma jurisprudencial citado pelo julgador de origem trata de
execução de obra de engenharia. Dessa forma, se a atividade-fim é diferente, o
mesmo acontece com a capacidade tributária ativa.
Tutela de evidência
Em decisão monocrática proferida em 24 de novembro de 2016, a desembargadora
Marilene Bonzanini deu razão à construtora, concedendo a tutela
de evidência para suspender a exigibilidade do tributo. Em análise mérito,
a relatora confirmou seu posicionamento na sessão de 6 de abril, conseguindo
adesão unânime no colegiado.
Nas razões de
decidir, Bonzanini observou que, embora não ficasse patente o perigo de dano ou
risco ao resultado útil do processo, a liminar deveria ser concedida com base
no artigo 311 do Código de Processo Civil. O dispositivo permite a concessão de
tutela de evidência quando houver prova documental suficiente acerca das
circunstâncias fáticas que constituem o direito invocado, com ou sem tese
firmada em recursos repetitivos ou súmula vinculante.
A seu ver, se
a empresa autora da ação não fez a obra, apenas prestou consultoria no
processo, não se pode concluir que tenha exercido atividade-meio, mas
atividade-fim. Em outras palavras, são relações jurídicas distintas: a
companhia prestou consultoria a outras empresas, que executaram a obra. “Fosse
a própria agravante a responsável pela execução da obra de engenharia,
inexistiriam dúvidas sobre a competência do município de Alpestre para tributar
o percentual de execução em seu território, com fundamento no art. 3º, III, da
LC 116/03”, complementou.
Para a
relatora, na medida em que se trata unicamente de atividade de consultoria em
projeto de engenharia, com subsunção ao item 7.03 da Lista Anexa à LC 116/03, a
capacidade tributária ativa é disciplinada no caput do artigo 3º — “no local do
estabelecimento prestador ou, na falta do estabelecimento, no local do
domicílio do prestador”. Essa é a regra geral, em se tratando de ISS, aplicável
ao caso.
“A sede do
estabelecimento prestador, in
casu, é Florianópolis/SC, conforme documentalmente comprovado, de
tal sorte que preenchidos os requisitos para a concessão de tutela da
evidência, na esteira do art. 311, IV, do CPC, para suspender a exigibilidade
do crédito tributário (art. 151, V, do CTN). Nessa quadra, ausente qualquer
elemento apto a justificar eventual modificação do entendimento adotado quando
da análise preliminar do recurso”, definiu a relatora.
Autor:
Jomar Martins
Conjur.
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