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A JUSTIÇA, O PODER DE POLÍCIA E O ALVARÁ DE ESTABELECIMENTO

  De início, é preciso esclarecer que não pertence à alçada municipal fiscalizar a capacidade ou legitimidade do exercício profissional de ninguém, ou examinar se a pessoa está auferindo lucros ou prejuízos. Não cabe ao Município investigar oficialmente se o registro de um Médico é legítimo, ou se aquele Contador entende realmente de Contabilidade. Compete à Administração Municipal, isso sim, fiscalizar os aspectos de segurança, higiene, localização, horário de funcionamento, sossego público e se a atividade autorizada não foi desvirtuada para outras não aprovadas. Não importa qual seja a atividade e sua localização. Parte da Sentença de Juiz sobre a exigência de alvará de funcionamento de um templo religioso: “(...) Outro equívoco da Impetrante, reside no fato de que, não obstante, no âmbito deste Município, tenha a isenção da Taxa de Funcionamento, tal fato não lhe exime de obter a respectiva Licença de Funcionamento, em virtude da existência de norma legal lhe impondo tal obrigação.

A dedução de materiais no ISS de serviços de construção civil



Durante o Simpósio de Campinas, organizado pela empresa Tributos 



Municipais, um participante perguntou durante a discussão do tema acima, qual 
seria, em termos práticos, a consequência da decisão monocrática da Ministra 
Ellen Gracie, relatora do RE 603.497, ao tomar a seguinte posição: “Esta Corte 
firmou o entendimento no sentido da possibilidade da dedução da base de 
cálculo do ISS dos materiais empregados na construção civil”. O participante 
queria saber se essa decisão, referente aos termos indicados no § 2º do art. 9º 
do Decreto-lei nº 406/68, influenciaria também a base de cálculo do imposto já 
sob a vigência da Lei Complementar nº. 116/03. A pergunta tem razão de ser, 
porque a referida decisão foi tomada em função da anterior redação, não 
exatamente a mesma da que está atualmente em vigor.
Vamos fazer um pequeno histórico comentado da matéria. 
Na redação original do Código Tributário Nacional (Lei n. 5.172/1966), o art. 72 
dizia: 
“Art. 72. A base de cálculo do imposto é o preço do serviço, salvo: I (...); II – 
quando a prestação do serviço tenha como parte integrante operação sujeita 
ao imposto de que trata o art. 52, caso em que este imposto será calculado 
sobre 50% (cinquenta por cento) do valor total da operação”. 
O artigo 52 se referia ao ICM. Bom lembrar que, naquela época, o imposto 
estadual era cobrado das construtoras em relação aos materiais adquiridos de 
terceiros ou próprios para aplicação nas obras contratadas. Por isso, criou-se o 
costume entre os Municípios de fazer uma espécie de estimativa, lançando o 
ISS apenas sobre uma parcela do preço total do serviço. Como se diz, o uso do 
cachimbo faz a boca torta, e esse critério perdurou por muito tempo, até 
mesmo depois do Superior Tribunal de Justiça decidir sobre a impossibilidade 
de esses materiais sofrer tributação pelo ICM, o que ocorreu no ano 2.000. 
Veio depois o Ato Complementar n. 34, de 1967, que alterou a redação acima. 
“Alteração 9ª – No art. 72, substitua-se o inciso II e acrescente-se um novo 
inciso, da seguinte forma: (...) 
III – na execução de obras hidráulicas ou de construção civil, caso em que o 
imposto será calculado sobre o preço total da operação, deduzido das parcelas 
correspondentes: 
a)  ao valor dos materiais adquiridos de terceiros, quando fornecidos pelo 
prestador do serviço; 
b) do valor das subempreitadas, já tributadas pelo imposto”.

O Decreto-lei n. 406/1968 manteve a redação acima no § 2º do art. 9º. Todavia, 
o Decreto-lei n. 834/1969 estabeleceu uma importante alteração na regra 
anterior: 
“IV – O art. 9º, § 2º, passa a vigorar com a seguinte redação: ‘§ 2º. Na 
prestação dos serviços a que se referem os itens 19 e 20 da lista anexa, o 
imposto será calculado sobre o preço deduzido das parcelas correspondentes: 
a) ao valor dos materiais fornecidos pelo prestador dos serviços; 
b) ao valor das subempreitadas já tributadas pelo imposto’”.  
Interessante observar que a nova redação exposta pelo Decreto-lei n. 834/69 já 
não se refere a “materiais adquiridos de terceiros”, e, sim, de “materiais 
fornecidos pelo prestador dos serviços”. 
E foi através do Decreto-lei n. 834/69 que,  pela primeira vez, anotou-se a 
exceção contida na lista de serviços: 
“19. Execução, por administração, empreitada ou subempreitada, de 
construção civil, de obras hidráulicas e outras obras semelhantes, inclusive 
serviços auxiliares ou complementares (exceto o fornecimento de 
mercadorias produzidas pelo prestador dos serviços, fora do local da 
prestação dos serviços, que ficam sujeitas ao ICM)”. 
Valiosíssimo o comentário de Bernardo Ribeiro de Moraes em sua obra 
magistral “Doutrina e Prática do ISS”, editada em 1978: 
“No regime inicial (CTN), o valor dos materiais (tijolos, telhas, ladrilhos, 
cerâmica, etc.) que o construtor adquiriu de terceiros e forneceu à obra, isto é, 
ao dono desta, era parcela dedutível. Mais tarde, no regime do Decreto-lei n. 
834, de 1969, art. 3º, n. IV, modificou-se a norma de dedução, incluindo para o 
ISS os materiais produzidos pelo construtor (ou prestador do serviço) dentro da 
obra e nela empregados. O ICM onera os materiais produzidos pelo construtor 
fora do local da prestação de serviços, embora aí os aplicasse. (...) O que se 
deduz é o valor do material fornecido pelo prestador dos serviços” (página 
533). 
Deste modo, se até a primeira redação do Decreto-lei n. 406/68 determinava-se 
a dedução de todos os materiais aplicados na obra,  a partir do Decreto-lei n. 
834/69, que alterou a redação do Decreto-lei n. 406/68, somente as 
mercadorias fornecidas pelo prestador, produzidas fora do local da obra, 
poderiam ser deduzidas da base de cálculo do ISS. E o motivo é evidente: em 
tais fornecimentos já incide o ICM, pois a lei dita “mercadorias”, bens em 
comércio, para mercancia, “vendidas”, pois, pelo prestador do serviço no papel 
de comerciante ou industrial. 
A Lei Complementar nº 116/03 trouxe a seguinte norma: 
“§ 2º. Não se incluem na base de cálculo do Imposto sobre Serviços de 
qualquer natureza: I – o valor dos materiais fornecidos pelo prestador dos

serviços previstos nos itens 7.02 e 7.05 da lista de serviços anexa a esta Lei 
Complementar”. 
Não encontro, realmente, grandes diferenças entre o enunciado da LC n. 
116/03 e o anterior, do Decreto-lei n. 406/68 com a modificação trazida pelo 
Decreto-lei n. 834/69. Enquanto um declara a não inclusão na base de cálculo, 
o outro trata do cálculo do imposto. Ou seja, em minha opinião, ambos tratam 
da mesma coisa: base de cálculo. Em outras palavras, não se deduz parcela 
do preço do serviço em tais hipóteses, porque, em todas as situações a base 
de cálculo sempre se orienta em função do preço do  serviço, entendendo-se 
como preço do serviço a parcela deste valor que se incorpora ao patrimônio do 
prestador. O que a lei não permite é acrescentarmos ao chamado preço do 
serviço os valores de outras operações de fornecimento de mercadorias se 
acertadas entre os contraentes.  
Vale lembrar que na empreitada é possível às partes contraírem mais de uma 
operação, algumas até independentes do próprio contrato de empreitada. 
Afinal, uma construtora pode ser também comércio e  indústria. Além de 
construir, ela pode ser contratada para fornecer um equipamento, uma 
máquina, de sua fabricação ou obtida no mercado. Em tais casos, o contrato, 
geralmente, define os bens que serão adquiridos pelo tomador do serviço, 
inclusive os seus preços. Uma grande construtora assume a obrigação de 
construir uma usina hidroelétrica, mas, ao mesmo tempo, fecha contrato de 
fornecimento das turbinas. Em vista da importância e do vulto do investimento, 
as turbinas são tratadas à parte, uma outra operação se delineia, embora 
integre o mesmo contrato da empreitada. As turbinas serão contabilizadas em 
contas específicas do ativo permanente do tomador do serviço e não incluídas 
no cômputo da edificação global da usina hidroelétrica. Serão fornecidas 
mediante emissão de nota fiscal mercantil (ICMS/IPI) e não podem ser 
tributadas pelo ISS. Neste raciocínio, é lógico, estamos pressupondo que essas 
turbinas são fabricadas fora do local da obra. 
Já os materiais indispensáveis e integrantes do contrato de empreitada não 
podem ser dissociados, como se fossem obrigações de dar coisas embutidas 
num contrato cuja prestação-fim é a obrigação de fazer. Neste teor, comenta 
Marcelo Caron Baptista: “Efetivamente, não há como  prestar um serviço de 
pintura sem a aplicação da tinta, como não se pode  prestar um serviço de 
confecção de roupa sem o tecido. A tinta, para o pintor, como o tecido, para o 
alfaiate, são insumos, sem os quais não há prestação de serviço. Sem os 
materiais, não há possibilidade nem de prestar o serviço e nem de provar a sua 
realização” (“ISS: do texto à norma”, Quartier Latin, p. 292). 
Retornando à decisão do Supremo Tribunal Federal, o Procurador Ricardo 
Almeida Ribeiro da Silva, no Agravo interposto pelo Município de Betim, diz o 
seguinte:

“A decisão monocrática ora recorrida parte de uma premissa falsa: a de que o 
Superior Tribunal de Justiça havia declarado inconstitucional  a dedução de 
materiais, por haver impedido a sua ampla utilização no caso concreto (RESP 
568.051-MG). Entretanto, o  Superior Tribunal de Justiça não  afirmou a 
inconstitucionalidade da norma inscrita no parágrafo 2º do art. 9º do DecretoLei n. 406/68 e muito menos a  impossibilidade  de dedução de materiais 
empregados por empreiteiras e demais empresas de construção na base de 
cálculo do imposto sobre serviços de qualquer natureza” (grifos do autor). 
Este foi o grande equívoco: o Superior Tribunal de  Justiça sempre distinguiu 
com clareza a hipótese da dedução (mercadorias fornecidas pelo prestador) da 
hipótese da não dedução (materiais adquiridos de terceiros para aplicação na 
obra). Mas, da forma lavrada, a decisão do STF, realmente, dá a entender que 
tudo deva ser deduzido da base de cálculo do ISS, o que provocará, 
certamente, efeitos danosos ao erário dos Municípios, inclusive o risco de 
serem obrigados a restituir impostos já cobrados e recebidos. 
Vamos torcer que os Ministros do STF reflitam com maiores cuidados sobre o 
tema e, pelo menos, acertem melhor os termos do enunciado. 

Autor: Roberto Tauil   




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