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A JUSTIÇA, O PODER DE POLÍCIA E O ALVARÁ DE ESTABELECIMENTO

  De início, é preciso esclarecer que não pertence à alçada municipal fiscalizar a capacidade ou legitimidade do exercício profissional de ninguém, ou examinar se a pessoa está auferindo lucros ou prejuízos. Não cabe ao Município investigar oficialmente se o registro de um Médico é legítimo, ou se aquele Contador entende realmente de Contabilidade. Compete à Administração Municipal, isso sim, fiscalizar os aspectos de segurança, higiene, localização, horário de funcionamento, sossego público e se a atividade autorizada não foi desvirtuada para outras não aprovadas. Não importa qual seja a atividade e sua localização. Parte da Sentença de Juiz sobre a exigência de alvará de funcionamento de um templo religioso: “(...) Outro equívoco da Impetrante, reside no fato de que, não obstante, no âmbito deste Município, tenha a isenção da Taxa de Funcionamento, tal fato não lhe exime de obter a respectiva Licença de Funcionamento, em virtude da existência de norma legal lhe impondo tal obrigação.

A incidência do ISS sobre serviços de hospedagem

Segundo informações veiculadas na imprensa, alguns hotéis ingressaram com ações na Justiça requerendo a inconstitucionalidade da incidência do Imposto Sobre Serviços em relação ao “aluguel” do quarto nas atividades hoteleiras, visto que a locação não pode ser interpretada como prestação de serviços. Um dos argumentos é a decisão do Supremo Tribunal Federal a respeito da locação de bens móveis, considerada incompatível às características básicas das obrigações de fazer do direito privado. Esses hotéis admitem a tributação do ISS sobre os demais serviços prestados, tais como, recepção, serviços de quarto, lavanderia, etc., mas não sobre o preço da locação em si. Querem, assim, desvincular o que chamam de locação dos demais serviços prestados durante a hospedagem. A matéria, porém, exige análise mais detida para atingir alguma conclusão. Vamos, por isso, comentar determinados aspectos da atividade hoteleira que possam auxiliar o entendimento do assunto. O contrato de hospedagem Com base na definição de Jônatas Milhomens e Geraldo Magela Alves, “contrato de hospedagem é aquele em que alguém (hoteleiro) se compromete perante outrem (hóspede) a prestar serviços de hotelaria, a alugar salão para eventos culturais, quarto ou apartamento mobiliado, a fornecer alimentos, a guardar bagagem ou bens, mediante pagamento de remuneração diária”. 1 O contrato de hospedagem pode ser considerado misto, pois resulta da combinação de diferentes espécies contratuais. Milhomens e Magela consideram a hospedagem um contrato atípico e misto, “por não estar disciplinado por diploma legal específico”. Diz Sergio Pinto Martins que, no Brasil, “o contrato de hospedagem é contrato inominado”. 2 Entretanto, embora não haja tratamento específico da matéria no Código Civil brasileiro, temos legislação especial sobre o assunto, a oferecer elementos básicos para a formação desses contratos, possuindo, assim, a natureza de contrato misto, mas de coligação necessária e obrigatória ao normativo imposto por lei. A normalização das atividades hoteleiras está regida pela Lei nº. 6.505, de 13 de dezembro de 1977, que integrou tais atividades nos chamados serviços turísticos, conforme dispõe o art. 2º da referida lei: Art. 2º - Consideram-se serviços turísticos, para os fins desta Lei, os que, sob condições especiais, definidas pelo Poder Executivo, sejam prestados por: I - hotéis, albergues, pousadas, hospedarias, motéis e outros meios de hospedagem de turismo; (...). 1 “Anual Prático dos Contratos”, 7ª ed., Rio de Janeiro, Forense, p. 314. 2 “Manual do Imposto Sobre Serviços”, 3ª ed., São Paulo, Atlas, p. 171. Já o art. 3º da Lei nº. 6.505 estabelece competência ao Poder Executivo de regulamentar as atividades das empresas turísticas (entre as quais as do ramo hoteleiro) para definir, entre outras, as relações com os usuários desses serviços, ditando os direitos, obrigações e responsabilidades das partes. Neste sentido, foi publicado o Decreto nº. 84.910, de 15 de julho de 1980, que veio regulamentar os termos da Lei nº. 6.505. O referido decreto denomina de “Meios de Hospedagem de Turismo”, “os empreendimentos ou estabelecimentos destinados a prestar serviços de hospedagem em aposentos mobiliados e equipados, alimentação e outros necessários aos usuários” (art. 2º). Dentre as obrigações estabelecidas no mencionado decreto, figuram as seguintes: I - cumprir os acordos e contratos de prestação de serviços turísticos ajustados com os usuários e outras empresas ou entidades, assim como executar os serviços oferecidos na qualidade, no preço e na forma em que forem mencionados em qualquer promoção ou divulgação realizada; II - manter os padrões de conforto, serviços e preços previstos nas normas gerais de classificação para o tipo e categoria dos empreendimentos ou estabelecimentos que explorem ou administrem, bem como os demais requisitos exigidos neste Decreto e nos atos dele decorrentes. Em âmbito de Poder Executivo, cabe ao Instituto Brasileiro de Turismo - Embratur -, autarquia do Ministério do Turismo, a competência de estabelecer as normas de operacionalidade das empresas hoteleiras, mediante o cumprimento do chamado “Regulamento Geral dos Meios de Hospedagem”. Este Regulamento conceitua da seguinte maneira as empresas hoteleiras: “Considera-se empresa hoteleira a pessoa jurídica, constituída na forma de sociedade anônima ou sociedade por quotas de responsabilidade limitada, que explore ou administre meio de hospedagem e que tenha em seus objetivos sociais o exercício de atividade hoteleira” (art. 2º). Observa-se que a primeira exigência diz respeito à personalidade jurídica da empresa hoteleira, excluindo, assim, as pessoas físicas de tal atividade. Não seriam, então, tratadas como integrante dessa atividade, por exemplo, as locações de imóveis residenciais para fins de temporada. Dentre os requisitos previstos no Regulamento Geral dos Meios de Hospedagem, consta a seguinte: - “seja administrado ou explorado comercialmente por empresa hoteleira e que adote, no relacionamento com os hóspedes, contrato de hospedagem, com as características definidas neste Regulamento e nas demais legislações aplicáveis” (inciso II, do art. 3º). Há, portanto, a necessidade de ser adotado um contrato de hospedagem específico e que venha a cumprir as regras definidas naquele Regulamento. Algumas das exigências são transcritas abaixo: Art. 8º - Os contratos para reserva de acomodações e hospedagem deverão ser sempre consubstanciados por documentos escritos, constituídos de: I - no caso de reserva de acomodações: troca de correspondências (inclusive via fax e Internet) entre os responsáveis pelo meio de hospedagem, ou seus prepostos, e o hóspede, ou agente de turismo contratante; II - no caso do contrato de hospedagem propriamente dito pela entrega pelo estabelecimento, durante o registro do hóspede (check-in), de ficha Nacional de Registro de Hóspede - FNRH, em modelo aprovado pela EMBRATUR, para preenchimento, assinatura e devolução pelo hóspede; § 1º - Respeitadas as reservas confirmadas, o estabelecimento não poderá se negar a receber hóspedes, salvo por motivo justificável ou previsto na legislação em vigor. § 2º - Será vedada a utilização, em qualquer procedimento ou documento que consubstancie o contrato referido neste artigo, de condição ou cláusula abusiva a que se refere o artigo 51, da Lei nº. 8.078, de 11/09/90 (Código de Defesa do Consumidor). § 3º - Para os fins deste artigo, todos os compromissos do meio de hospedagem e os em relação a seus hóspedes, bem como as obrigações destes deverão ser divulgados adequadamente. § 4º - As informações referidas no parágrafo anterior deverão estar à disposição, do hóspede, sempre que solicitado. § 5º - Os responsáveis pelos meios de hospedagem deverão garantir prioridade de ocupação a pessoas portadoras de deficiência, nas UH adaptadas para seu uso. Art. 22 - É dever dos meios de hospedagem cumprir e honrar, permanentemente, os contratos ou compromissos divulgados, explicitados ou acordados com o consumidor, especialmente as reservas e preços de hospedagem previamente ajustados. Diante de tantas particularidades, razoável o entendimento de que o contrato de que se trata apresenta singularidades específicas, em razão das quais não poderia ser ajustada aos preceitos amplos da locação de bens imóveis. Vale registrar, neste particular, o comentário do atual Ministro do Supremo Tribunal Federal, Eros Roberto Grau, ao elaborar parecer por consulta da Embratur: “O conjunto de considerações até este ponto expostas pode ser sumariado nas seguintes conclusões: a) o contrato de hotel é o celebrado entre o hotel e o usuário de seus serviços, tendo por objeto a hospedagem remunerada; b) o contrato de hotel implica, em sua essência, uma locação de coisa imóvel, uma locação de coisas móveis, uma locação de serviço, um depósito e, potencialmente, um penhor; c) como tal - como contrato de hotel - se configura o contrato celebrado entre o designado ‘hotel-residência’ e os usuários de seus serviços; d) o contrato de hotel, contrato típico - inclusive o de ‘hotelresidência’ - consubstancia um negócio singular, ao passo que o contrato de ‘apart-hotel’ consubstancia um negócio misto” (grifo nosso). 3 Ao que importa no momento, constata-se que o eminente jurista considera o contrato de hotel de formato jurídico típico, em vista do negócio singular firmado entre as partes. Ou seja, a regulamentação legal estritamente específica das relações econômicas assumidas entre o hotel e o hóspede, dá ensejo a adquirir o contrato uma tipicidade em suas formas jurídicas. Percebe-se, assim, que os hotéis e similares são regidos por leis especiais, distanciando-se do alcance da legislação especial de inquilinato. De fato, o sentido da palavra ‘locação’ só pode ser reservado, exclusivamente, ao contrato que tem como causa única proporcionar a alguém o uso e gozo temporário de uma coisa restituível. 4 E, neste sentido, evidente que a prestação de serviços não se restitui, pois fica pertencendo e se exaure com quem o pagou. 5 Os serviços turísticos Diz ainda o referido Regulamento que os meios de hospedagem são obrigados a oferecer, no mínimo, aos hóspedes: I - alojamento, para uso temporário do hóspede, em Unidades Habitacionais (UH) específicas a essa finalidade; II - serviços mínimos necessários ao hóspede, consistentes em: a) Portaria/recepção para atendimento e controle permanentes de entrada e saída; b) Guarda de bagagens e objetos de uso pessoal dos hóspedes, em local apropriado; c) Conservação, manutenção, arrumação e limpeza das áreas, instalações e equipamentos. III - Padrões comuns, a seguir: - Quanto às posturas: a) licenciamento pelas autoridades competentes para prestar serviços de hospedagem, inclusive dos órgãos de proteção ambiental; 3 Revista dos Tribunais, vol. 546, 1981, pp. 36-47. 4 Ver “Contratos”, de Orlando Gomes, Rio de Janeiro, Forense, p. 264. 5 Diz Cunha Gonçalves: “O característico da locação é o regresso da coisa locada ao seu dono, ao passo que o serviço prestado fica pertencendo a quem o pagou, e não é suscetível de restituição” (citado por Orlando Gomes, in “Contratos”). b) administração ou exploração comercial, por empresa hoteleira: c) oferta de alojamento temporário para hóspedes, mediante adoção de contrato, tácito ou expresso, de hospedagem e cobrança de diária, pela ocupação da UH; d) exigências da legislação trabalhista, especialmente no que se refere aos vestiários, sanitários e local de refeições de funcionários e Comissões de Prevenção de Acidentes de Trabalho - CIPA. - Quanto a serviços e gestão: a) portaria/recepção apta a permitir a entrada, saída, registro e liquidação de conta dos hóspedes, durante as 24 horas do dia; b) registro obrigatório do hóspede no momento de sua chegada ao estabelecimento, por meio de preenchimento da Ficha Nacional de Registro de Hóspedes - FNRH, aprovada pela EMBRATUR; c) limpeza e arrumação diária da UH, fornecimento e troca de roupa de cama e banho, bem como de artigos comuns de higiene pessoal, por conta do estabelecimento; d) serviços telefônicos prestados aos hóspedes de acordo com os regulamentos internos dos estabelecimentos e as normas e procedimentos adotados pelas concessionárias dos serviços, ou pelo poder concedente; e) imunização permanente contra insetos e roedores; f) pessoal de serviço em quantidade e com a qualificação necessárias ao perfeito funcionamento do meio de hospedagem; g) pessoal mantido permanentemente uniformizado e/ou convenientemente trajado, de acordo com as funções que exerçam; h) meios para pesquisar opiniões e reclamações dos hóspedes e solucioná-las; i) observância das demais normas e condições necessárias à segurança, saúde/higiene e conservação/manutenção do meio de hospedagem, para atendimento ao consumidor. Destarte, são vários os serviços que deverão ser prestados ou colocados à disposição dos hóspedes, assumindo o hotel uma série de obrigações que se relacionam entre si e se tornam dependentes umas das outras. Outro ponto a assinalar está relacionado com os aspectos construtivos do imóvel que teria condições de ser tratado como estabelecimento hoteleiro. O Regulamento dispõe: - Quanto aos aspectos construtivos: a) edificações construídas ou expressamente adaptadas para a atividade; b) áreas destinadas aos serviços de alojamento, portaria/recepção, circulação, serviços de alimentação, lazer e uso comum, e outros serviços de conveniência do hóspede ou usuário, separados entre si, e no caso de edificações que atendam a outros fins, independentes das demais; c) proteção sonora, conforme as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas - ABNT - e legislação aplicável; d) salas e quartos de dormir das UH dispondo de aberturas para o exterior, para fins de iluminação e ventilação; e) todos os banheiros dispondo de ventilação natural, com abertura direta para o exterior, ou através de duto; f) serviços básicos de abastecimento de água que não prejudiquem a comunidade local, bem como de energia elétrica, rede sanitária, tratamento de efluentes e coleta de resíduos sólidos, com destinação adequada; g) facilidades construtivas, de instalações e de uso, para pessoas com necessidades especiais, de acordo com a NBR 9050 - 1994, em prédio com projeto de arquitetura aprovado pela Prefeitura Municipal, como meio de hospedagem, após 12 de agosto de 1987. Em caso de projetos anteriores, o meio de hospedagem deverá dispor de sistema especial de atendimento. - Quanto a equipamentos e instalações: a) instalações elétricas e hidráulicas de acordo com as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas - ABNT - e legislação aplicável; b) instalações de emergência, para a iluminação de áreas comuns e para o funcionamento de equipamentos indispensáveis à segurança dos hóspedes; c) elevador para passageiros e cargas, ou serviço, em prédio com quatro ou mais pavimentos, inclusive o térreo, ou conforme posturas municipais; d) instalações e equipamentos de segurança contra incêndio e pessoal treinado a operá-lo, de acordo com as normas estabelecidas e pelo Corpo de Bombeiros local; e) quarto de dormir da UH mobiliado, no mínimo, com cama, equipamentos para a guarda de roupas e objetos pessoais, mesa-de-cabeceira e cadeira. Fácil observar, diante de tão extensa lista de exigências, que não seria admissível comparar uma simples locação de imóvel às atividades hoteleiras. O imóvel tem que possuir estrutura compatível ao exercício da atividade e adequar-se às exigências legais. De fato, a hospedagem em hotéis segue normas que seriam consideradas incomuns em um contrato típico de locação. A respeito, diz o art. 8º do Regulamento: Art. 8º - Os contratos para reserva de acomodações e hospedagem deverão ser sempre consubstanciados por documentos escritos, constituídos de: I - no caso de reserva de acomodações: troca de correspondências (inclusive via fax e Internet) entre os responsáveis pelo meio de hospedagem, ou seus prepostos, e o hóspede, ou agente de turismo contratante; II - no caso do contrato de hospedagem propriamente dito pela entrega pelo estabelecimento, durante o registro do hóspede (check-in), de ficha Nacional de Registro de Hóspede - FNRH, em modelo aprovado pela EMBRATUR, para preenchimento, assinatura e devolução pelo hóspede; § 1º - Respeitadas as reservas confirmadas, o estabelecimento não poderá se negar a receber hóspedes, salvo por motivo justificável ou previsto na legislação em vigor. § 2º - Será vedada a utilização, em qualquer procedimento ou documento que consubstancie o contrato referido neste artigo, de condição ou cláusula abusiva a que se refere o artigo 51, da Lei nº. 8.078, de 11/09/90 (Código de Defesa do Consumidor). § 3º - Para os fins deste artigo, todos os compromissos do meio de hospedagem e os em relação a seus hóspedes, bem como as obrigações destes deverão ser divulgados adequadamente. Temos, então, que distinguir a hospedagem da locação “típica”: o contrato de hospedagem tem características próprias e cumpre objetivos peculiares de uma atividade empresarial. Não se trata de um contrato específico de locação de imóvel residencial, nem tampouco comercial, que possuem regras não aplicáveis ao contrato de hospedagem, como, por exemplo, os artigos 574, 577 e 578 do Código Civil. Foi dessa forma o entendimento da 2ª Câmara Cível do Tribunal de Alçada de Minas Gerais, na Ap. nº. 105.952-1, de 13.03.91: “Em se tratando de contrato de hospedagem, que se caracteriza pela prestação de serviços hoteleiros, é injusta a oferta do pagamento em consignação, e, portanto, justa a recusa, uma vez que inexiste locação a justificar a proteção da Lei do Inquilinato”. Além disso, o extenso rol de exigências, acima transcrito, demonstra que os estabelecimentos hoteleiros são obrigados a manter especificações e estrutura técnica e operacional perfeitamente adequadas ao negócio. Percebe-se, nitidamente, que a relação entre o hotel e o hóspede em muito se distancia da relação locador e locatário. A prestação-fim da relação é a prestação de serviços, obrigando-se o hotel a mantê-los e servir aos hóspedes. Nas palavras de Marcelo Caron Baptista, “a essência da prestação está no fazer, que se exterioriza em uma série de utilidades voltadas ao bem-estar temporário do hóspede”. 6 6 “ISS: do texto à norma”, São Paulo, Quartier Latin, p. 326. A “locação” do quarto nada mais é do que uma prestação-meio do objeto contratual firmado entre o hotel e o hóspede. Este, em nenhuma hipótese, pretende alugar um quarto, mas, sim, ter à sua disposição uma série de serviços a que o hotel se propõe a prestar. Tais serviços são indispensáveis à concretização da prestação do serviço como um todo, podendo a falha de um só serviço caracterizar a desconstituição do contrato. O caso, por exemplo, de desaparecimento de bagagem, motivo da decisão abaixo: “O contrato de hospedagem constitui uma locação de serviços e o depósito da bagagem dos hóspedes equipara-se ao necessário. Assim, caracterizada a negligência dos prepostos do hoteleiro na guarda dos bens pertencentes aos hóspedes, na ausência de caso fortuito e força maior, há de responsabilizar-se aquele por danos ocorrentes ao proprietário de objetos furtados do interior do estabelecimento comercial” (2ª Câmara Cível do TA-PR, na Ap. nº. 43.911-2, julgada em 19.02.1992). O “apart-hotel” ou “hotel-residência” O “apart-hotel” ou “hotel-residência”, ou qualquer denominação similar atualmente utilizada, compreende um grupo de unidades habitacionais pertencentes a mais de um proprietário, em regime condominial. A administração do condomínio (que pode ser constituída pelos próprios proprietários, ou através de empresa autônoma) presta serviços especiais aos condôminos, tais como arrumação e limpeza dos apartamentos, lavagem de roupas, recepção, segurança, lazer, etc. O condomínio em edificações é regulado pela Lei nº. 4.591/64, que estabelece a individuação de cada unidade autônoma. O proprietário da unidade tem o direito de alugar o seu apartamento, desde que cumpridas as obrigações condominiais. Neste caso, não importa se estamos tratando de “apart-hotel”: o contrato firmado entre o proprietário e o interessado é, sem dúvida, de locação. Nas palavras já transcritas de Eros Roberto Grau, “no contrato ‘apart-hotel’, a parte que figura em uma das pontas da relação jurídica não está no exercício de indústria de hotelaria, mas no exercício da atividade de prestador de um serviço de locação”. Não é, entretanto, a mesma coisa, quando ocorre a intervenção de um terceiro, no caso, da empresa administradora do condomínio. Alinham-se aí duas modalidades de contratos: o primeiro, entre o proprietário e a administradora, pelo qual o proprietário autoriza a locação do seu apartamento a terceiros, sob total responsabilidade da administradora. O segundo, a administradora hospeda terceiros no apartamento do locador, exercendo, muitas das vezes, atividades típicas de hotel. Explica Eros Roberto Grau: “Indispensável observar, todavia, que - como esclareceu, ainda, a consulente - algumas vezes, excepcionais, os autodenominados “apart-hotel” atuam efetivamente como meios de hospedagem, na medida em que celebram com os usuários de suas unidades autênticos contratos de hospedagem. Tal pode ocorrer em quatro hipóteses: a) todas as unidades do ‘apart-hotel’ pertencem a um só proprietário; b) tais unidades pertencem a vários proprietários, sendo exploradas como meio de hospedagem pela empresa administradora do condomínio; c) tais unidades pertencem a vários proprietários, sendo a sua administração, como meio de hospedagem, contratada a uma empresa de hotelaria; d) tais unidades pertencem a vários proprietários, sendo que uma parte delas é explorada, em conjunto, como meio de hospedagem, mediante administração por uma empresa de hotelaria” (...). Cabe ressaltar que estamos nos referindo aos chamados “apart-hotel” ou “hotéis-residenciais”, pois é comum em outros condomínios a locação de apartamentos pela administradora, mas sem as características de hotel. Há, portanto, que distinguir a locação por si só dos contratos de hospedagem. E a distinção é clara: se houver características de meios de hospedagem, como recepção, alojamento, segurança, arrumação, limpeza, lavanderia, telefone, etc., estaremos diante de uma prestação de serviços. A relação passa a ser, nitidamente, de obrigações de fazer. Aliás, consta, no RESP nº. 196.028/RJ (Rel. Ministro Ari Pargendler, publicado em 1º de março de 1999, 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça), referência à decisão da 7ª Câmara Cível do Tribunal de Alçada Cível do Estado do Rio de Janeiro, sobre a qual diz o Ministro Relator: “Tais apartamentos, a toda evidência, não se destinam à ocupação pelo proprietário, ou à sua locação a terceiros, permanentemente ou por temporada, hipóteses em que seria indiscutível a sua destinação residencial. Na realidade, o que neles se explora é a atividade de hotelaria, de cunho comercial portanto, com toda a gama de serviços que um hotel propicia a seus hóspedes. A prosperar o mascaramento que ultimamente se tem dado a aparthotéis, dentro em pouco desaparecerão o que tradicionalmente se conhece como hotéis, pela óbvia vantagem perante o fisco de se explorar, como se fosse residencial, imóvel que não tem esta destinação, senão finalidade comercial”. Podemos, assim, concluir que os contratos firmados entre hóspedes e hotéis, inclusive os de hóspedes com administradoras de “apart-hotel”, estes últimos quando prestam serviços de hotelaria, não se caracterizam como contrato de locação, possuindo natureza típica e específica que não conciliam aos contratos regidos pela legislação do inquilinato. Incabível seria, também, distinguir a locação pura dos serviços hoteleiros, pois as atividades são, em conjunto, as que integram os meios de hospedagem, inexistindo uma sem a outra. A distinção atingiria o absurdo de determinar um hóspede que loca um apartamento sem usufruir dos serviços e aquele que somente usufrui dos serviços sem hospedar-se. A piorar, quem determinaria as especificações dos valores no preço da diária? Se for o próprio hotel, certamente o valor da “locação” atingiria 90%, 95%, 99% do valor total, ou até mesmo argumentar que os serviços de hospedagem sejam meras cortesias da empresa hoteleira, e o que o hóspede paga é apenas a locação do apartamento. fonte Roberto Tauil Março de 2009 www.consultormunicipal.adv.br

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